Nestor Rolim viajou com Zé Limeira?

Semana passada escrevi neste espaço que o poeta Zé Limeira fez cantoria na fazenda Melancias, hoje distrito do município de Santa Helena. Houve quem debochasse, isso não tem fundamento! Se for invenção, minha não é. Vai para a criatividade de Orlando Tejo, que imortalizou o excêntrico repentista no inusitado Zé Limeira, poeta do absurdo, livro de muitas edições, com milhares de exemplares, hoje ofertado em sebos até por 850,00!

Nele, Orlando Tejo narra a ida às Melancias.

Zé Limeira, que só viajava a pé, a muito custo aceitou trepar num carro-de-boi. E o fez na companhia de um colega, repentista José Alves Sobrinho, e do estudante Nestor Rolim. Percorreram cerca de 30 km até a alpendrada casa de Raimundo Rolim, onde se deu a peleja entre os dois vates populares. Bela noite de festa sertaneja, como nunca a redondeza tinha participado: comida e bebida à vontade, muitos “vivas” aos artistas afamados.

“Mestre Raimundo Rolim, Capataz das Melancia, Eu posso até lhe ensinar Repente e pilogamia, Abeia tem a ciência, A lua é quem alumia”.

“Macho de abeia é zangão E feme de home é muié, Quem quisé vá no cortiço, Chegue lá e beba o mé, Cachorro vai pelo faro Quem tem linha é carrité”.

“Getúlio Vargas morreu Foi com saudade da esposa, Lampião inda tá vivo Morando perto de Sousa, Por detrás do Sete-Estrelo Tem um casal de raposa”.

No intervalo, conta Orlando Tejo, “Nestor Rolim redige o primeiro mote da cantoria”: Canta, canta, cantador, Que teu destino é cantar. Zé Limeira inicia a glosação:

“Quando o carão tá cantando É sinal que vem inverno, Eu sou um nego moderno, Foi não foi eu tou pensando. Amanhã tô viajando Pru sertão de Bogotá. Tico-tico no fubá, Padre Juiz e Doutor, Canta, canta, cantador, Que teu destino é cantar”.

“Numa berada de serra Dom Pedro ficou de coca, Começou tirá taboca Do cabeceiro da terra, Veio a febre berra-berra Pru dentro dum caçuá, Comendo o tamanduá Da filha do Promotor, Canta, canta, cantador, Que teu destino é cantar”.

Entusiasmado, Nestor ofereceu outro mote: Quem sabe o que sou, sou eu, Sou eu quem sabe o que sou. Zé Limeira abafou:

“Um dia eu passei pru dentro Duma cancela deserta, Tava a lua toda aberta Debaixo dum pé-de-vento… No terreiro do convento Um canário me chamou, Daí o juiz chegou Pra prendê João Eliseu… Quem sabe o que sou, sou eu, Sou eu quem sabe o que sou.”

Nestor Rolim veio do Rio para comemorar seus 86 anos, em Cajazeiras, sábado, dia 16. Taí a oportunidade ímpar para relatar sua (a)ventura com Zé Limeira!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Publicações relacionadas
CLIQUE E LEIA

Bar do Dércio

Quase toda cidade tem seu bar de destaque. Trata-se do boteco preferido pela cerveja geladíssima; pelo petisco; pelo…
CLIQUE E LEIA

Gente é a gente

Ouço dizer sempre que a oração é um pedido. Partindo de tal ponto, vejo o quanto sou pidona.…
Total
0
Share