Cantoras

VALIOMAR ROLIM

A cidade estava em festa. Era um casamento para nunca mais esquecer. A família Albuquerque fez para ninguém botar defeito o que seria o casamento do século, as bodas da irmã de Borel. São José do Rio do Peixe, à época Antenor Navarro, estava que era um gozo só. Até para o povão teve comida e bebida.

Como convidados estavam os Rolim de Cajazeiras, os Gadelha e Abrantes de Souza, os Carneiro de Pombal, os Ribeiro Coutinho de João Pessoa, todos os prefeitos e deputados da região e até o governador do estado.

Não era nada, mas cento e cinqüenta perus, vinte bois, cinqüenta carneiros e duzentas galinhas tinham sido abatidos, sem falar nos canapés e nos garçons de Campina Grande que foram contratados. Não poderia ser uma daquelas festinhas comuns. Até a rádio difusora de Cajazeiras, recém inaugurada, e única da região, não falava de outra coisa.

O pai da noiva era orgulho só. Não bastasse ser pai de Borel, o solteirão mais cobiçado da região, faria o casamento que levaria o nome da cidade a fronteiras nunca dantes alcançadas.

Decorar a igreja foi pouco, enfeitou-se toda a cidade. Em todos os acessos da zona urbana foram feitos portais, à moda do arco do triunfo de Paris, para saudar os numerosos convidados de outras cidades e estados.

A cerimônia foi uma apoteose. O coral do colégio Padre Rolim, a orquestra Manaíra, a banda feminina de Cajazeiras, os convidados elegantes, tudo isso resultou num espetáculo de sonhos. Só que o pai da noiva não concebia a idéia de que Borel, o irmão orgulho da noiva, não estar presente.

A recepção parecia festa de reis. A família da noiva, para ter o brilho de uma corte, ressentia-se da falta do solteiro mais cobiçado, alegre, charmoso e rico das redondezas: Borel. A ausência dele era como uma presença, muito notada.

Muito agastado com a falta do filho, o dono da festa exultou com a sua chegada. Só não assimilou, nem admitiu, a companhia dele. Como poderia trazer, ao casamento da sua irmã, aquelas mulheres de aparência tão vulgar? Louras de farmácia, com roupas extravagantes, modos espalhafatosos e aparência chula. Não perdoou, chamou o filho, no meio da festa, e cobrou dele o fato trazer, na maior festa da família e da cidade, aquela trupe. Como introduzir, no meio das famílias, aquelas mundanas?

O chefe do clã ficou satisfeito com a explicação do filho, até ficou orgulhoso, ouviu que eram as coristas de Nelson Gonçalves, que havia se apresentado em Cajazeiras.

O pior é que, depois disso, e até hoje, no alto sertão, corista é sinônimo de garota de programa.

VALIOMAR ROLIM, MÉDICO E EMPRESÁRIO

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