Sonhos: nona parte

Enquanto vigiávamos o horizonte, esperando o Sol nascer, apareceu um enorme espelho. Não entendíamos mais onde era o lado leste. Dentro do quadro, pois era emoldurado o vidro, surgiram outras e outras plataformas espelhadas. Neste dia, éramos vinte pessoas, todas esperando. Cada uma, de repente, segurou um espelho. Cada espelho, uma cor, um formato, um tamanho, mas algo que cabia na palma da mão.

Não era um simples objeto de colocar na bolsa ou no nécessaire. Brilhava. Movimentava-se em ondas. Mudava em algumas dimensões. Convidava-nos a entrar. Num dos convites, entramos. Sem medo. Claro que não era um convite à toa. Cada um entrou no seu espelhinho e viu um mundo gigante.

Espelhinhos múltiplos se proliferaram quando cada um se sentiu no seu habitat de espelhos. No primeiro espelho em forma de quadrado, vi que eu era um peixe. Olhei para o meu corpo: realmente, eu estava com escamas muito reluzentes. Olhei para os lados. Cada um dos meus amigos também tinha virado peixe. Cada um com suas nadadeiras, suas barbatanas, seus peitos encouraçados. O ar borbulhava. Estávamos dentro d’água.

Andávamos como na cidade, sem nadar. Na nossa comunicação, saíam bolhas. Que engraçado. Falas com bolhas e bolhas naquele ambiente azul-esverdeado. Olhei para os cantos das ruas: corais, centenas de corais. Mais além: uma ponte de ostras que parecia uma obra de arte. Vi um edifício inteiro de algas, espécie de prédio de antigos moradores. Gente que parecia nos receber com tranquilidade. Gente, não. Criaturas aquáticas.

A água era limpíssima. Uma temperatura agradável, hospitaleira, familiar. Cavalos-marinhos passavam como se nos conhecessem. O trânsito era fluido, educado, paciente. Eu só podia estar noutro mundo mesmo. Depois de alguns minutos, olhamos para o alto: uma luminosidade forte nos sugou, bem devagar. Conduziu o grupo para um navio. As escamas de todos sumiram. Avistamos um belo farol.

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