Não vale um cibazol

A semana começou com a revelação do diálogo entre Romero Jucá e Sérgio Machado, dois investigados pelo Ministério Púbico. O desdobramento imediato do episódio mostrou as trapalhadas de Jucá ao dizer que se referia à economia brasileira quando, de fato, mirava a Lava Jato. Na tentativa de defender-se, a cada frase mais se atolava em suas próprias travessuras de antigo menino-prodígio, descoberto por Marco Maciel e projetado como gestor público à sombra da ditadura. Adaptou-se, porém, com facilidade à democracia. Esperto, chegou a ser líder do governo do PT no senado. Agora, esqueceu um pormenor que lhe foi fatal: a liberdade de imprensa.

Jucá menosprezou ainda a ação da Polícia Federal, da Justiça, do Ministério Público. Propalou apoio à Lava Jato, alegando ter votado em Rodrigo Janot para procurador geral da República. Nesse ponto da entrevista, Jucá exaltou-se. Foi mais loquaz ainda. Revi três vezes este trecho do áudio. Descobri na exasperação de Romero Jucá, no leve tremor da face e, sobretudo, na expressão do olhar perdido, a lembrança de antigo companheiro do governo Fernando Henrique Cardoso: Geraldo Brindeiro. Que saudade, hein, Romerinho!

Naquela época, as denúncias cabeludas dormiam na gaveta do chefe da PGR, outro pernambucano do grupo do vice-presidente. Ora, Brindeiro guardava a sete chaves os processos comprometedores de políticos ao ponto de ser apelidado de engavetador geral da República. Bons tempos aquele, hein, Jucá! A propósito, no diálogo exibido na mídia e em redes virtuais no dia 23, Sergio Machado faz a seguinte avaliação de Rodrigo Janot:

Ele acha que eu sou o caixa de vocês, o Janot. Janot não vale um cibazol. E ele está visando Renan e vocês! E acha que eu sou o canal.

Não vale um cibazol!

Cibazol era um comprimido – usado largamente no século XX para combater dor de cabeça, dor de dente, resfriados banais – de eficácia duvidosa, mas comprado a três por dois, por força da propaganda. Do cibazol restou aquele significado pejorativo, muito conhecido no Nordeste. Quando se quer debochar do poder curativo de um medicamento ou da ação de alguém, diz-se, não vale um cibazol. Igual a caldo de batata!

Veja quem fala!

Sergio é empresário, por herança do pai, Expedito Machado, que foi ministro de Jango. E foi eleito senador na onda da modernização política cearense, capitaneada por Tasso Jereissati e jovens empresários do CIC – Centro Industrial do Ceará. Prestaram, aliás, bom serviço à então atrasada política do Ceará, dominada anos a fio por três coronéis do Exército: Virgílio Távora, Cesar Cals e Adauto Bezerra.

Mas isso é história.

Os jovens de ontem, ficaram velhos. Velhos e corruptos. Carcomidos como os membros das oligarquias da República Velha. São esses homens que tramaram o impeachment de Dilma. A gravação do diálogo escancara isso. E puseram Temer na presidência para barrar as investigações comandadas pela Operação Lava Jato, a mais séria, eficiente e eficaz ação coordenada do Ministério Público, Polícia Federal, Receita Federal e Justiça para estancar a rapinagem de organizações criminosas que sangram os recursos públicos no Brasil.

Janot, apenas uma peça dessa engrenagem, faz esse salseiro todo como mero cibazol. Imagina se fosse penicilina!

P S – Esta semana eu ia escrever acerca do sucesso do lançamento do livro Guerra ao fanatismo: a diocese de Cajazeiras no cerco ao padre Cícero. Mas o cibazol me deu uma coceira danada… 

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