“Não se vê gente pedindo pão na padaria”

É difícil de acreditar, mas essa foi uma afirmação do presidente da república num programa de TV nesta semana, questionando os dados que apresentam a escalada da fome no Brasil. Ele insiste em ignorar o drama vivido por mais de trinta milhões de brasileiros que estão sem ter o que comer diariamente. Teima em desconhecer o levantamento feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.

Ainda que inadmissível, essa declaração do presidente não nos surpreende. Por vários motivos. Primeiro, em razão da sua personalidade. Ele tem demonstrado ser uma pessoa sem sentimentos, sem compaixão, sem empatia, sem espírito de solidariedade com os que estão passando por necessidades. Foi assim durante a pandemia, reagindo com indiferença e sarcasmo diante do caos sanitário que vivenciamos. Então o seu temperamento faz com que não se constranja em fazer a indagação: “a gente vê alguém pedindo pão na porta de uma padaria?”

Em segundo lugar porque, para ele, é mais cômodo questionar a informação de que boa parte da população brasileira está passando fome. É preferível não aceitar a realidade de que, no seu governo, o Brasil voltou ao mapa da fome da ONU – Organização das Nações Unidas. Isso faz parte do seu discurso negacionista, que, lamentavelmente, é aceito pela bolha ideológica que o segue, apesar das evidências em contrário. Como não apresenta solução para o grave problema, nem se preocupa em buscar formas de enfrentá-lo, “lava as mãos” e diz: “não há fome no Brasil”. Segundo a ONU mais de 61 milhões de brasileiros vivem em situação de algum tipo de insegurança alimentar.

O que o presidente se recusa a ver, nós vemos todos os dias, em frente às padarias, aos restaurantes, aos supermercados, nos semáforos. É uma constatação dolorosa para qualquer um ser humano que tenha o mínimo de empatia em relação à tragédia vivida por outros. Menos para ele.

Não foi a primeira vez que negou a existência da fome no Brasil. Em 2019, quando concedia uma entrevista à imprensa estrangeira, na condição de presidente da república, afirmou: “Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora, passar fome, não”.

Li em algum lugar uma frase que dizia: “um homem com fome não é livre”. A fome aprisiona. Então, para muitos, não é bom adotar políticas públicas de combate à fome, porque assim fica mais fácil, através de medidas paliativas, dominar a consciência dos esfomeados. O estômago os obriga a aceitar as esmolas como sendo um grande benefício que justifica a retribuição em votos como agradecimento.

Na falta de vontade política para resolver tão grave crise, que pelo menos ficasse calado. Seria menos desumano.

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