As muriçocas de sempre

O por do Sol no Açude Grande continua lindo e com as muriçocas de sempre. Essa fase crepuscular de todos os dias no cenário cajazeirense seria mais bonita se o Açude fosse mais atraente.

O manancial que serviu para banhar tanta gente, inclusive Mário Filho que, numa das suas muitas composições, diz que se molhou nas águas de lá (duvido), seria bem mais atraente se as muriçocas de sempre dividissem o espaço com uma senhora infra-estrutura. E como seria esta senhora? Seria, no mínimo, confortável para turistas, já que não comporta banhistas, e, claro, para o povo daqui.

O céu parece eterno quando se pinta de laranja, rosa, azul, branco e outras variações de vermelho e amarelo, no entardecer. Situação complicada, mesmo para a mão mestra de um artista como João Braz, que jamais conseguirá tamanha beleza. É que a beleza do Grande não se empreende por mãos humanas. Mas a sua despoluição, sim. A paisagem das suas margens, pelo menos as urbanas, sim.

Sim ao Açude Grande, que continua belo e com a sua orla enfeitada de admiradores, com as suas causas secretas, enamoradas ou embriagadas. Mas, isto não é tão fácil. O lixo é o inquilino do Grande, e o pior: não paga aluguel em dia. Aliás, o lixo coabita sem lei, suga a beleza sem medidas, é o parasitário da falta de uma política séria para implementar aquela área. Sai daí, lixo.

As luzes são tímidas, mas resolvem. Mas seria bem melhor se um projeto arrojado contemplasse também uma iluminação especial, bares, caminhos, trilhas, descobertas práticas. Um parque, uma praça ao redor, uma orla, menos qualquer coisa. A gente não aceita mais gambiarra.

Chega de olhar o por do Sol, saber que ele é majestoso, não perde para nenhum outro, e saber que ainda estamos no tempo de Mãe Aninha. O açude, agora, é a cara de Inácio, quando ainda nem era Padre Rolim. O Açude parece que estacionou por lá. Quando sangra, arranca tudo o que é de expectativa. As baronesas saem nadando, entopem, como sempre, o canal, e o lixo acompanha a comitiva de vegetais.

Mãe Aninha deve estar feliz porque não mexeram na paisagem do Grande, porque não conseguiram urbanizar de fato (e de direito nosso e do rejuvenescimento do lugar), a sua piscina de outrora.

Eu queria ser menos lírica, mas a paisagem assim o exige: que eu seja mais ou menos crepúsculo, mais ou menos cheiro de mato, mais ou menos solar. Eu queria ser mais arredia com tamanha incapacidade dos nossos administradores dos últimos 200 anos, mas a paisagem não deixa e pede para eu ser simples.

Sai daí, então, lixo. Desengavete-se, então, projeto de reurbanização do Açude Grande, porque a beleza da cidade está em apuros. Se o futuro ajudar, nossos cartões postais poderão ser as muriçocas de sempre.

1 comentário
  1. Você falou tudo Cristina, a população de Cajazeiras espera que esse projeto de revitalização do açude saia desta gaveta que é trancada a sete chaves. Belas palavras, parabéns pela iniciativa. 👏

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