A nossa impotência

O sentimento de impotência e de fragilidade nos assalta em muitos momentos de nossas vidas. Em algumas circunstâncias essas sensações são provocadas por situações para as quais a nossa racionalidade humana ainda não elaborou respostas ou alternativas de superação ou de pacífica convivência com suas conseqüências e ressonâncias. Impotência e fragilidade que nos deixa atônitos, por exemplo, diante da morte e de sua inescrutável compreensão.

Mas, em nosso cotidiano a impotência também nos deixa paralisados e atordoados diante de situações para as quais não encontramos respostas nos meios que, historicamente, os grupos sociais vão instituindo como mecanismos de disciplinamento e de organização da vida em sociedade. A cena parece corriqueira e se naturaliza ante a omissão de quem teria a responsabilidade de organizar o uso do espaço público e as formas de ocupação desse espaço, de maneira que todos os habitantes tenham as mesmas prerrogativas e gozem das mesmas condições de trafegabilidade, de respirar o ar limpo, de ter uma rua asseada, sem resíduos obstruindo bueiros, sem material de construção interditando calçadas e vias públicas, sem cadeiras e mesas de barracos e trailers privatizando caminhos que são de todos.

Um rápido passeio pelas ruas de nossa cidade nos oferece uma recorrência de episódios reveladores da ausência de uma legislação contemporânea que discipline o uso dos espaços públicos e puna seus transgressores sem o apadrinhamento herdado do apoio em campanhas eleitorais. No mesmo compasso caminha a omissão e a total negligência do poder público, em todas as suas instâncias – executivo, legislativo, judiciário – em fazer cumprir, de maneira isonômica e equilibrada, a legislação já existente que, mesmo capenga e defasada, impõe limites e estabelece fronteiras, elenca permissividades e interdições, define obrigações e estabelece sanções para os que habitam a cidade.

Além de desrespeitar as regras de civilidade que, culturalmente, foram montadas pelos grupos humanos no seu processo de sociabilidade e de humanização, ou seja, de se fazer gente, os episódios nefastos que se repetem com abundância e prodigalidade pelas ruas de nossa cidade imprimem para todos nós e, também, para eles que nos visitam ou que cruzam nossas fronteiras, um atestado de miséria política. Não somos capazes de  produzir e, principalmente, de fazer obedecer, aos códigos e regras que organizando a vida pública dos cidadãos eduquem a todos sobre a concepção de que ruas, calçadas, árvores, bancos, praças, canteiros, postes, fios, luminárias, placas de sinalização são equipamentos coletivos e imprescindíveis a uma relação minimamente satisfatória de tolerância e de vivência coletiva.

Aceitar essas regras nos fazem mais civilizados, não apenas no sentido evolutivo de acúmulo de etiquetas e práticas sociais, mas como construtores de cultura que nos faz representar o mundo onde vivemos como expressão de nossos atos e gestos cotidianos.

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