A bomba do Apolo XI

Cajazeiras foi também palco dos atentados terroristas ocorridos nos primeiros cinco anos da década de setenta, quando o Brasil ainda vivia sob o regime da ditadura militar. Presume-se que tenham sido episódios perpetrados por agentes do próprio governo, insatisfeitos com a abertura política anunciada pelo então Presidente Ernesto Geisel. A intenção era atribuir responsabilidades aos que chamavam de “subversivos”, aqueles que contestavam o regime imposto com o golpe de 1964, numa forma de justificar o impedimento da redemocratização no país.

Como em qualquer cidade interiorana, boa parte da população já estava adormecida, quando na noite do dia 02 de julho de 1975, por volta das vinte e uma horas, foi acordada pelo barulho ensurdecedor de uma bomba estourada no cine-teatro Apolo XI. Até hoje esse “ato terrorista” continua envolto em mistério, sem que se tenha conhecimento dos seus autores.

O artefato explosivo foi colocado embaixo da poltrona em que costumava se sentar o bispo de Cajazeiras, Dom Zacarias de Moura. O funcionário Geraldo Galvão encontrou uma pasta, tipo 007, quando fazia uma varredura no local, antes do fechamento do cinema. Chamou o soldado Didi para, junto com ele, descobrirem a razão daquele “achado” estranho. Abrindo a mala preta perceberam um objeto que imaginavam tratar-se de um gravador. Próximo deles o porteiro Manoelzinho, gritou: “Não mexe, isso é uma bomba”. Assustado o soldado soltou a bolsa no chão, que veio a explodir.

A bomba, embora de fabricação caseira, tinha alto teor explosivo, com potencial para matar dezenas de pessoas se o acontecimento tivesse ocorrido com a sala de projeção cheia de expectadores para assistir ao filme Sublime Renúncia. O artefato mortífero, além de ter causado enormes estragos ao cinema, arrancando a grade da entrada, feriu o segurança do cinema Altino Soares, que ficou com as pernas amputadas; o porteiro Manoelzinho, com um pedaço de madeira na cabeça; o operador de projetor Geraldo Conrado, com uma perna partida e corpo atingido por fragmentos e o adolescente Geraldo Galvão, com abdômen perfurado e as pernas queimadas. Transportados para João Pessoa, Manoelzinho e o soldado Didi vieram a falecer.

Dom Zacarias não estava no cinema naquela noite, pois cumpria atividades da igreja em viagem a Recife. Ao retornar a Cajazeiras, uma semana após o incidente concedeu uma entrevista ao jornal A União em que declarou: “Não tenho inimigos, se ideologicamente entre em divergência com outras pessoas, não vejo razão nenhuma para que isso justifique um atentado, pois sou apenas um discípulo de Deus”.

O atentado ganhou repercussão nacional, abrindo espaço para interpretação de motivações políticas. Dom Zacarias de Moura, era um religioso da ala conservadora da Igreja Católica, se contrapondo aos seus colegas Dom José Maria Pires e Marcelo Carvalheira, considerados progressistas. Na suposição de que ele teria sido o alvo do ato terrorista, os agentes da ditadura militar se apressaram em acusar o crime como uma ação de militantes da esquerda. Algo muito parecido com o que ocorreu no Rio Centro, anos atrás, conforme reconheceu o general Bandeira, em 1981, em conversa com o dentista Abdiel de Sousa Rolim, ao afirmar: “são da mesma safra”.

As primeiras suspeitas recaíram sobre o deputado Bosco Barreto, o técnico em eletrônica Inácio Assis e o padre norte-americano Francis Boyer, conhecido como Mister Boy. Nada ficou comprovado contra qualquer um deles.

A Comissão Estadual da Verdade tentou desvendar o mistério e apurar a autoria intelectual do atentado. No entanto, concluiu que “tudo não passou de mais uma provocação de agentes da ditadura militar descontentes com a abertura anunciada pelo presidente da República, general Ernesto Geisel”.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Publicações relacionadas
CLIQUE E LEIA

Querido Açude Grande

Mistérios transpassam, com liberdade, aquele horizonte. Mistérios. É a barra que nos diz algumas frases. É aquela linha…
Total
0
Share