Saudade do meu tempo

Amanheci com saudade do meu tempo de criança, onde o mundo que me cercava era composto por quatro ruas além da minha.

Do tempo que nós irmãos éramos ninhadas cercados pela grande asa de mamãe, que fazia questão de proteger a todos contra as coisas nocivas que o mundo tentava ensinar.

Havia na realidade uma troca simbiótica entre nós e tudo que não servia para os mais velhos se tornavam novos ao nosso corpo, seja sapato ou roupas.

Éramos amantes do amor, e na rua nos defendiam os como feras encurraladas para que não houvesse qualquer agressão que viesse atingir os nossos.

Como éramos muitos, os dois mais velhos tinham seu quarto, com direito a colchão, minha única irmã tinha o mais belo com guarda roupa, cama e todos acessórios de uma dama, os outros, um quarto onde dormíamos em rede e as roupas eram colocados em cabides.

Com toda esta diferença trazíamos no coração o espelho do amor que tanto pregava nossos pais, no almoço fazíamos fila para que minha mãe após esmagar o feijão com toucinho e farinha fizesse o capitão para que fosse distribuído, e isto para nós era a glória.

A nossa teoria era que mexeu com um mexeu com todos, e o tempo passava, levando dentro de nós um rastro de saudade de algo que não se apaga com a borracha do tempo.

E hoje procuro rememorar a beleza de um passado, onde nas tempestades das doenças, sentávamos à mesa, minha mãe escrevia em papeis, a empregada fazia a cola de goma e nós pregávamos nas dezoito portas e janelas, que dizia: Senhor, nos livre da peste, da fome e da gripe asiática.

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