Frassales, em livro, ressalta ‘morticínio’ eleitoral histórico no Sertão

NONATO GUEDES

No próximo dia cinco de maio, à noite, na Livraria do Luiz, no Mag Shopping, em João Pessoa, o escritor Francisco Sales Cartaxo Rolim, “Frassales”, lançará o livro “Morticínio eleitoral em Cajazeiras”, em que relata, em dez capítulos, um entrevero entre liberais e adeptos do Partido Conservador, na cidade de Cajazeiras, Alto Sertão da Paraíba, em 18 de agosto de 1872, que vitimou, entre outros, o tenente João Antônio do Couto Cartaxo. O sangrento episódio ocorreu em dia de eleição municipal, por isso ficou conhecido como “o morticínio eleitoral em Cajazeiras”. Autor da obra “Do Bico de pena à urna eletrônica”, Cartaxo, que foi secretário de Planejamento do Estado no governo Ivan Bichara Sobreira, no final da década de 1970, aponta que o ‘morticínio’ é sempre lembrado, mas há muita desinformação acerca das causas, motivações e de alguns personagens envolvidos. Diz ele que não pretende esgotar o assunto mas, sim, provocar o debate histórico, devidamente contextualizado, com o intuito de tentar esclarecer pontos obscuros.

O tenente João Cartaxo, um dos próceres do Partido Liberal de Cajazeiras, comandou cerca de 50 homens armados no embate verificado na Praça da Matriz e que teve ampla repercussão além-fronteiras. A sangrenta disputa provocou a morte de seis pessoas e ferimentos em outras tantas. “Apesar da gravidade do conflito, a historiografia política paraibana ignora o fato e suas consequências”, verbera Frassales. O livro, na verdade, reúne textos já publicados, divididos em quatro blocos, o primeiro dos quais destaca a singularidade da origem de Cajazeiras, graças à figura emblemática do padre Inácio de Sousa Rlm. No capítulo sobre traços da história do Poder Judiciário em Cajazeiras, a obra acolhe perfis biográficos de dois cajazeirenses ilustres: Cristiano Cartaxo Rolim e Sabino Rolim Guimarães. No ensaio final, o escritor sugere uma releitura do governo Ivan Bichara, “frente a discutíveis interpretações historiográficas”. Segundo diz, a metodologia usual privilegia a personalidade do governador em detrimento da aferição dos resultados concretos, em termos de modernização e de benefícios para a população.

Francisco Sales Cartaxo explica que tem dedicado grande parte de suas energias ao estudo do nosso passado. “Há muito por conhecer e interpretar episódios até hoje nebulosos, apesar do esforço de dedicados pesquisadores que deixaram preciosos escritos. Relevantes, porém, insuficientes para identificar as causas verdadeiras de fatos e da conduta de alguns personagens no século XIX, capazes de formar consistente arcabouço da política cajazeirense. Impõe-se, portanto, estabelecer conexões entre o contexto econômico, familiar, político e partidário, que perdurou décadas e décadas, desde nossa origem como arruado, no começo do século, até depois do vitorioso movimento de 1930”. O morticínio, conforme seu relato, instalou medo e pavor no seio das famílias cajazeirenses e, o mais importante, produziu efeitos duradouros na vida política, com forte projeção além do Império. “Por não se conhecer o episódio com profundeza criaram-se versões fantasiosas, que abrigam um emaranhado de dúvidas e equívocos, alguns cristalizados, propagados pela tradição, com enfeites imaginosos, transmitidos de geração a geração (…) Procuro separar fatos e versões, ficção e realidade, verdades e mitos, com base em dados aos quais não tínhamos acesso até poucos anos”, acrescenta.

Presidente e membro-fundador da Academia de Cultura e Letras de Cajazeiras – Acal, instituição de grande conceito dentro e fora da Paraíba, Francisco Sales Cartaxo agita temas polêmicos e pertinentes, na linha do revisionismo histórico ético, para estabelecer, mesmo, o confronto com versões já disseminadas pela tradição da oralidade, mesclada por injunções políticas e por fatores conjunturais. Ele enfrenta esse desafio com a categoria de pesquisador-historiador, que premiou a Cultura da Paraíba com outras obras, a exemplo de “Guerra ao fanatismo – A diocese de Cajazeiras no cerco ao Padre Cícero”. A respeito desta obra, Carlos André Cavalcanti, em prefácio, pontuou: “Este é um livro de História do Brasil, da mesma forma que livros de história do Rio de Janeiro ou de São Paulo o são”. E complementou: “Cartaxo está nesta historiografia que gosto de chamar de livre como um elogio carregado de uma certa dose de inveja aqui confessada”. São contribuições assim que tornam Frassales respeitado para além dos umbrais da comunidade acadêmica.

No que diz respeito ao governo de Ivan Bichara Sobreira, ao qual serviu como secretário de Planejamento, interferindo diretamente na formulação de políticas públicas que, mais tarde, iriam ter prolongamento mais eficaz, Cartaxo se entrega no novo livro ao que chama de “uma revisão necessária”, fazendo uma análise geral da administração e detalhando as principais obras e serviços na região de Cajazeiras. Ivan Bichara governou o Estado ao ser escolhido por via indireta pelo regime militar, na década dos chamados “governadores biônicos” de que fizeram parte, ainda, Ernani Sátyro e Tarcísio Burity. Cartaxo destaca a sensibilidade social do ex-governador Ivan Bichara e, até mesmo, contribuição relevante que ele deixou para o processo de desenvolvimento e de modernização do Estado da Paraíba. São informações e análises valiosas que contribuem para aclarar discussões e sepultar erros ou equívocos porventura anexados à narrativa de fatos decisivos para a historiografia da Paraíba e do Nordeste. A formação intelectual de Frassales mistura-se à sua formação técnica para fornecerem um rico painel com jeito de radiografia sobre a nossa realidade histórica.

NONATO GUEDES É JORNALISTA

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