O governador

VALIOMAR ROLIM

O prefeito estava feliz, a cidade mais ainda, não era todo dia que o governador visitava à cidade. Essa visita revestia-se de maior importância. Não era só um vice que assumira, o Dr. Pedro Gondim, governador, agora eleito viria à cidade. Preparou-se a maior festa. Chico Rolim, o prefeito, não cabia em si, de tão satisfeito, era a própria festa.

A casa do prefeito estava repleta. Eram autoridades civis, militares e religiosas; eram políticos, lideranças, cabos eleitorais, portadores de cargos de confiança e, como não podia deixar de ser, os bajuladores.

Era tudo pompa. Os melhores talheres, a porcelana e os cristais guardados para ocasiões especiais. Dona Terezinha, a primeira-dama, se esmerara, lanches, salgados, refrigerantes, tudo, menos bebida alcoólica, quem iria sustentar aquelas esponjas de bom whisky? E Sua Excelência não podia ser importunado por bêbados, alem do mais, sabe-se, autoridades sempre atrasam.

Tudo programado nos menores detalhes. O governador teria o beija mãos ali mesmo, no alpendre. Depois, seria conduzido ao gabinete da casa onde teria audiência com o prefeito e autoridades da região.

A conversa era boa. Mesmo envolvidos no papo, cada um imaginava uma maneira de fazer o seu pedido, sua reivindicação, numa forma de colocar o papelinho no bolso do paletó do homem, quando alguém anunciou sua chegada.

Foram vivas, abraços, apertos de mãos, emoções a toda, alguns chegaram a chorar, teve até uma velhinha que cutucou o governador com uma agulha, para ver se ele sangrava como os comuns mortais.

Acalmada a euforia da chegada triunfal, ofereceu-se ao governador a mais nova cadeira de balanço da casa, feita com estrutura de ferro envolvida por tiras cilíndricas de plástico, conhecidas como macarrão, a maior novidade em mobiliário da época.

Depois de agradecer, o mandatário sentou-se e começou um balanço que resultou numa espetacular queda. Fez-se um silêncio profundo que até constrangeu a autoridade. Muitas mãos solícitas acudiram. O governador foi erguido, com tanta rapidez, e por tantos, que pareceu que ia voar.

Conversou com todos, não havia no comportamento de ninguém dos presentes, nada que lembrasse a hilária queda. Ouviu, foi ouvido, deixou fluir toda a sessão do beija mãos e, só então, entrou com o prefeito para a programada audiência privada.

Entraram, o governador, o prefeito e os eleitos para a audiência diferenciada. Um dos convidados do baixo clero os seguiu e, após conferir, sinalizou para os demais que já encontravam-se no gabinete.

A risada foi geral.

DO LIVRO ‘O CRONISTA DO BOATO’, DE VALIOMAR ROLIM

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