Z   Y   I

Não foi tão difícil passar pela entrada do fone. Fui entrando e percebendo os fios coloridos. Engraçado: lá dentro estava claro, ventilado e estranhamente acolhedor.

Uma válvula me sorriu, quase em estado profundo de eletricidade. Ficamos atraídos e observamos a conjunção de zinco que havia do lado esquerdo. Fui até lá por uma trilha pontilhada de cobre. Um cano escuro, de plástico, talvez, estava na minha frente, enfeitado com cartilagens que se adequavam a outros fios. Era um labirinto bom de se descobrir.

Fui entrando e procurando novas fontes. Atrás da faísca vermelha, uma placa que parecia um espelho deixou meu rosto iluminado. Acima, um pedaço de ferro atiçava minhas interrogações, que vieram muitas, que vieram todas. “Para que serve?”: eu perguntava, nos guinchos da hora.

Comecei a correr. A correr em alegria. Eu me machucava com os grampos de uma pontezinha de alumínio. E corria, corria, corria sem parar, sem pensar em cansaço. Pulava as engrenagens, as micropartículas, as pequenas e grandes peças de acrílico. Como eu corria.

Por um instante, a luz do ambiente piscou. Eu continuei correndo, desta vez com medo. Tudo estava se mexendo, com uma harmonia grandiosa. O espaço fechado se entreolhava e começava a fervilhar. Na cabeça, uma energia foi me fazendo correr e me conscientizando como íon. Eu era, naquele momento, um íon que procurava uma conexão, apesar do meu corpo linear.

As paredes pareciam tão concretas e tão estruturadas, que eu continuei correndo, como se fosse morar ali, para sempre. Os fios, com todas as proteínas sonoras que carregavam, eram um balanço contínuo. Os encaixes borbulhavam, numa espécie de carga, num mantra sintético e azulado.

Tudo era energia mesmo. Eu continuava a corrida, pensando que minha órbita seria aquela. Continuava e acelerava como nunca, com uma euforia que chegava com a luminosidade. Corria, enquanto algo parecido com um trovão fez vibrar a placa que me serviu de espelho. Foi, nesse instante, que eu entrei por lá. Foram me achatando, para que eu coubesse no cano transparente de amianto. Como eu estava feliz. Eu corria muito mais do que antes, com uma velocidade absurda.

Fui correndo, as luzes eram firmes, invariáveis, belas. Consegui me agregar. Fui sugado, com outros companheiros energizados, por uma força, dizem, social. Saímos por um buraco estreito, que rodava. Era o controle do volume. Fui diminuindo o ritmo, fomos juntos, numa direção combinada. Olhei para baixo: vi os ponteiros, os marcadores, os tuíteres. Tudo vibrava. Já estávamos mais calmos. Éramos a extensão da onda, transformados em voz. A antena nos alimentava no vento.

Percorremos milhões de lares, sempre com uma mensagem nas mãos. Numa casa, fizemos alguém se emocionar. Noutra, despertamos a capacidade de indignação. Naquela outra, musicamos a informação, divulgamos a notícia, participamos com o ouvinte. Rimos e choramos, numa correria nossa, interna, sacrificada e positiva. Sítios, riachos, pontes, praças, prédios: permanecemos nesses lugares, com uma alimentação balanceada por quem nos escuta. 

Mesmo à bateria, somos atuantes, somos marcantes, somos lendários. Somos o Rádio.

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