Onde está o crime?

A quem interessa a CPI do MST? Uma questão que extrapola as fronteiras e muros da sensatez e da decência quando a transformação do alimento em mercadoria inverte a roça em pastagem e monocultura, cuja necessidade é determinada pela cotação de bolsas e mercados, passando ao largo de roncos e carências de barrigas famintas.

E, nessa lógica do agronegócio, cantado e alardeado em vinhetas televisivas onde o “agro é pop”, leis e políticas são implementadas tendo como meta a quebra de recordes de produção. Recordes que são aquilatados pelos contêineres que se avolumam em porões de grandes navios mercantes que partem dos portos em direção aos mercados europeus, asiáticos, norte-americanos. Navios que deixam um rastro de terra arrasada, de floresta devastada, de terras indígenas invadidas, de queimadas e solos encharcados de defensivos químicos, herbicidas, sementes transgênicas.

Ora, aos tolos que gritam contra a destruição, aceitem estas como banais consequências ante as estatísticas reveladoras de um país moderno, de uma agricultura pujante, tecnológica, que esconde em seus reluzentes silos e  serelepes drones o sofrimento de milhares de trabalhadores escravizados. Que apagam os vestígios de arvores e espécies que tombam e evaporam na trilha da extinção, de culturas e modos de vida que desaparecem na gananciosa expansão do capital que não consegue estabelecer o menor sinal de convivência com o “atraso”, o “singelo”, o “comum” de homens e mulheres que, tendo a terra como fonte de vida, a ela devolve o respeito e o cuidado.

Aos tolos também não merece credibilidade as constatações de que a “bancada ruralista recebeu doações de invasores de terras indígenas”. Como ter credibilidade uma investigação realizada pela organização não governamental “De Olho nos Ruralistas” que, ao cruzar dados  das doações eleitorais em 2018 e 2022 com os registros de imóveis do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA),  constata que 18 parlamentares que integram a chamada “Bancada Ruralista” receberam financiamento de campanha, ou seja, doações eleitorais, de “proprietários de terras” cuja integralidade ou parte considerável de suas fazendas estão em “território indígena homologado ou em processo de homologação”.

Tolice, isso é conversa de “comunista” com “dor de cotovelo” que tenta emperrar o “progresso do país.

E continuemos tolos acreditando que a criminalização do MST, personificada na CPI, nasce de uma motivação ética dos que defendem um país livre e justo. Ora, inocentes criaturas, neste país não tem espaço para a roça do pobre com a macaxeira, o inhame, o feijão, o gergelim, o jerimum, a banana, a galinha ciscando no oitão da casa e, nos dias de feira, uma barraca vendendo para os também pobres, trabalhadores da cidade, o alimento que cresce na convivência com a caatinga, o cerrado, o pantanal, a mata.

Onde não ronca os motores dos motosserras, das semeadeiras e colheitadeiras, de aviões e caminhões, não nasce desenvolvimento. Esta é a lei.

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