O país da meia-entrada

Viajei recentemente à nossa capital, e talvez por causa do pouco que vou no nosso litoral e por causa da inflação que apesar de negada efetivamente existe, achei cara a tarifa da passagem de mais de noventa reais, que um cidadão que ganha por exemplo um salário mínimo, veria escoar nesses pagamentos, uma parte muito significativa de seus ganhos, apenas para pagar esse trajeto. Então perguntado por quê, o vendedor deu a explicação que os bilhetes reservados a estudantes e idosos, já se tinham esgotado e somente haviam essas ”passagens mais caras”.

Em João Pessoa, por motivo de sair depois da hora do rush, quando os ônibus ficam superlotados, eu escolhi uma cadeira próximo ao cobrador, e ele depois de me cobrar pouco mais de dois reais, me perguntou por que eu ainda não tinha “carimbado” minha carteira de identidade com o nome IDOSO, que assim eu não pagaria a tarifa e entraria pela porta de saída. Ora, um serviço, qualquer que seja, eu sempre achei que deveria ser cobrado, e andar quase vinte quilômetros, a dois reais e centavos (tarifa de idoso – arghh), era uma ninharia, se comparada às perigosas viagens nos nossos mototáxis, que cobram três reais (talvez a emoção e o perigo que passam passageiros e motoqueiros, sejam o diferencial), mas aí vem o que me motivou a escrever essas linhas: as tarifas deviam ser pagas de maneira igual por todo mundo.

Exceto talvez, os muito novos (bebês) ou os muito velhos, por uma questão mais de liberar o acesso para todos, dizer que uma pessoa com 60 anos tenha que ser amparado pelo governo ou que um estudante de mais de vinte anos também tenham direito diferenciado, eu acho uma injustiça, pois as tarifas baixas ou gratuitas haverão de serem cobertas pelos, assim chamados “adultos”, ou pior, indiretamente pala maior carga tributária do mundo, isso eu acho privilégios imerecidos. Pior, vem a idéia do estado paternalista, que deve proteger “a juventude estudiosa e os velhinhos necessitados”, enquanto o cidadão comum é escorchado, isso o pobre, pois, os remediados (interessante: remédio na Idade Média significava comida, muito mais que medicamento) tem a disposição seus veículos e estão se lixando para os “pobres mortais”, que precisam de serviços públicos.

Isso, aqui, nesse rincão esquecido do Nordeste, onde nem São Pedro se lembra mais, prá mandar uma chuvinha. Em Brasília eu vivenciei esse processo num estado mais aperfeiçoado: quando passava por lá, estava se apresentando uma turnê internacional da banda de Rock Iron Maiden, foi a maior turnê mundial de uma banda da história, mais de 160 apresentações. Mas não interessa os detalhes desse show, Vou dizer um só: O crooner,  quando viu uma pequena briga na platéia, disse em inglês: “Aqui não, deixem para brigar no show de Lisa Minelli” que se apresentaria na outra semana, noutro espaço exclusivíssimo, e com mesas caríssimas.

Pedindo desculpas por essa interrupção,  mas revendo a camisa guardada do show ele aconteceu em 2008, o convite mais barato era R$ 150,00 reais, isso por um show de duas horas, então eu perguntei como era que pessoal, pois roqueiro é sempre meio liso, ia arrumar aquele montante, e Denis Rodrigues (filho de Ribamar Rodrigues), que foi comigo, disse é porque todo mundo tem carteira de estudante aqui em Brasília, e vou conseguir a sua, depois de arranjar uma amiga dele que trabalhava num desses cursos, La fui eu, devidamente travestido de “estudante de taquigrafia”, e com o que não gastamos, tomamos todas durante o show. A gente termina se acostumando com esse tal “jeitinho brasileiro”, e depois, fica achando normal uma situação que na verdade encobre uma injustiça.

Poderia escrever laudas e laudas de situações semelhantes, mas fica a conclusão, aqui é o país da meia entrada, da lei de Gerson, do privilégio imerecido, só que se tem de prestar atenção que alguém está pagando por esses ou outros privilégios que desfrutamos cotidianamente, no mais das vezes, o contribuinte. O problema é que os privilegiados acham que seus privilégios são de origem divina e não um artificialismo distorcido, em que alguém termina pagando por esse privilégios. A Revolução Francesa começou por causa de um projeto de nobres e clero pagarem impostos, que foi defenestrada e depois cabeças (inclusive a do Rei) rolaram. Guardadas as devidas proporções algo semelhante acontece a nossa volta.

Estou vendo o arrastar (se é que se arrasta) da Reforma Política, esta só sai por iniciativa popular, deixar essa tarefa para à classe política, é como li recentemente, “entregar ao macaco um serrote para que Ele serre o galho onde está trepado”, ou seja não vai sair nunca… 

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