Modesto, Adriano Brocos e outras lembranças

Quando da entrega de minha última crônica para o nosso Gazeta, em cima da hora, com erros de ortografia (meu troca-letra), o professor José Antônio me perguntou qual o papel dele no projeto do Palácio do Bispo de nossa cidade, e como se podia saber a veracidade dessa participação.

Eu que vivi minha infância ao lado do fogão de Dona Cartuxinha, vinha da escola de Dona Carmelita para ouvir estórias de almas, demônios e fantasmas das cozinheiras da casa do Major Galdino, onde hoje vivo, e também ficava prestando atenção a toda a história da minha família materna ao lado da Singer de Dona Ceci que, enquanto costurava, ficava me contando as coisas da Cajazeiras de antigamente.

Então, pedindo escusas aos poucos, cada vez mais poucos, leitores, vou tentar repetir o que ouvi da minha família sobre esses meus dois ancestrais: Modesto e Adriano.

A primeira coisa que vou contar, ouvi de Dr. Clóvis Matos, foi da primeira e única vez em que o professor Modesto Brocos esteve nos visitando. Ele, que era espanhol de Santiago de Compostela (província da Galícia, quando veio visitar seu filho e nora, aqui posso contar duas situações que ouvi e me recordo.

A primeira é que ele, um dos maiores pintores que por nosso país apareceu, o fim do século XIX e começo do século XX, quando veio pra cá, já não conseguia mais pintar, devido a algum problema relacionado à sua avançada idade. Levava o cavalete e o banco de pintura para a parede do Açude Grande e, ao ver nosso por do sol, ficava se lamentando: “Ah! Se eu ainda pudesse pintar…”.

Outra coisa que me disse o Dr. Clóvis, foi quando o professor Brocos veio pra cá, o que ele mais gostava era de passear de jumento, que lhe trazia lembranças de sua Espanha, que quando ele vivia lá, era como eles se deslocavam.

Como sua chegada foi muito divulgada, Dom Moisés Coêlho, então bispo diocesano, o convocava para dar andamento ao palácio episcopal que estava sendo projetado. O professor ia ver o bispo e ficava lamentando que “aquele bispo chato” não o deixava fazer os passeios de jumento de que ele gostava para ficar trabalhando no projeto do nosso prédio.

Dá para se avaliar seu papel nesse projeto da seguinte forma: o professor Brocos, como passou na cidade meses e não pelo menos um ano, não deve ser o autor do projeto completo. O que eu acho que ele pode ter feito foi enriquecer com detalhes, pois quando das várias vezes que visitei o Palácio, acho (certamente sem nenhuma prova documental) que as pinturas do forro do teto podem ter sido detalhadas por ele.

Talvez a sacada desse prédio tenha sido projeto seu. Digo isso fazendo uma comparação com outras obras de sua lavra, como a fachada da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, uma obra monumental em estilo neoclássico, famosa em todo o país.

Nosso palácio episcopal é modesto comparado a suas obras maiores e nessa breve visita a nossa cidade, ele não teria tido tempo de projetar alguma obra da complexidade do nosso Palácio do Bispo. Mas que houve alguma contribuição, eu sinceramente acho possível. Minha mãe Ica tinha apenas três anos quando do seu falecimento em 1936.

O mesmo não podemos atribuir a seu filho, Adriano, engenheiro calculista que residia aqui e que realmente foi o engenheiro e calculista da nossa Catedral Diocesana. Nas plantas que foram resgatadas por Rogério Galvão, quando iam para o lixo, aparecem os nomes dos arquitetos de Fortaleza e de Adriano Brocos como executor e calculista, inclusive da torre, que ainda é a maior de nossa cidade. Quando vou à missa em nossa igreja maior, não deixo de sentir orgulho de meus ancestrais.

Outra obra de Adriano é onde hoje funciona o Bradesco, na Praça Dom João da Mata. Aquela marquise foi a primeira a ser construída em concreto e os operários, aproveitando uma viagem sua ao Rio, retiraram as escoras antes do tempo e ela veio a cair. Ele fez tudo de novo e deixou se passar o tempo da cura. Depois de retirar as escoras, passou um dia inteiro embaixo dela para provar que seu trabalho era confiável. Soube, inclusive, que minha avó veio trazer almoço pra ele embaixo da marquise. O prédio serviria como uma espécie de clube social da família Matos.

Pronto, fico por aqui. Não vou cansar meus leitores com histórias familiares. Se tiver tempo e saúde, publico alguma coisa específica.

Fico.

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