Invasão militar na Universidade de Brasília

No final de agosto de 1968, mais precisamente no dia vinte e nove, acontecia a mais violenta ação militar da ditadura naquele ano, quando trinta carros da polícia civil, duas companhias da polícia militar e agentes do DOPS e SNI invadiram o campus da Universidade de Brasília, a pretexto de realizarem as prisões de universitários que apontavam como “subversivos”, entre eles, Honestino Guimarães, principal líder estudantil daquela universidade. O cineasta paraibano Vladimir de Carvalho levou ao cinema cenas do acontecimento na montagem do filme “Barra 68”, num documentário que retrata a resistência dos alunos à invasão das tropas militares na UnB.

A estrutura física da universidade foi depredada pelos agentes da repressão, salas de aula foram invadidas por forte aparato policial, estudantes e professores foram agredidos e levados com as mãos na cabeça para a quadra de esportes, onde houve uma triagem. Ao todo cerca de sessenta deles foram presos. O estudante de engenharia mecânica Waldemar Alves da Silva Filho, ao ouvir gritos, chegou à varanda do andar superior do prédio onde funcionava o Instituto Central de Ciências, quando foi atingido por uma bala na cabeça, ao lado do olho esquerdo. Após ser baleado, ficou dez dias em coma e dois meses internado num hospital. Ainda hoje busca uma reparação pela agressão e suas consequências.

Vários parlamentares, ao tomarem conhecimento da ocorrência, foram à Universidade prestar solidariedade aos estudantes ou socorrerem parentes. O deputado Santire Sobrinho que fora buscar sua filha universitária foi espancado pela polícia. No mesmo dia, na Câmara Federal, o deputado Wilson Braga, em discurso pronunciado na tribuna, denunciou a violência praticada contra os estudantes, afirmando: “Não só a ARENA, mas a mesa da Câmara deve imediatamente designar comissão especial para se inteirar dos fatos e tomar as providências que o caso requer. Protesto com veemência contra a brutal e covarde invasão da Universidade de Brasília por parte da polícia, ocorrida hoje. Manifesto minha inteira solidariedade à luta estudantil que se processa em todo o país”. Wilson Braga era deputado filiado a ARENA, partido que dava apoio parlamentar ao governo.

Um documento subscrito por sessenta deputados que formavam a base do governo, foi tornado público, tendo entre os signatários os paraibanos Pedro Moreno Gondim e Wilson Braga: “Os congressistas que este subscreve, integrantes da ARENA, manifestam o seu pesar e sua repulsa pelos atos de violência que foram vítimas os funcionários, alunos e professores da Universidade de Brasília. Tais atos, a par de concorrerem para dificultar o trabalho que o governo vem desenvolvendo em favor da melhoria do ensino no país, desgasta a autoridade governamental, porque nivela a violência e a brutalidade. Externam também a confiança de que o governo da República, a que emprestam apoio consciente e patriótico, tomará todas as providências necessárias à apuração dos acontecimentos e suas conseqüências, além de exercer a ação enérgica no sentido de que os mesmos não se repitam”.

Outro manifesto que ganhou grande repercussão nacional foi divulgado por mães e esposas dos estudantes em Brasília: ”As mães e esposas de Brasília sentem chegada a hora de tornar pública sua aflição pelas cenas de selvageria e inominável violência que, mais uma vez, ensanguentaram a Universidade de Brasília. O que nós, mães e esposas, sempre desejamos é somente ver nossos filhos e maridos estudando e trabalhando em paz e segurança, dentro de um Brasil capaz de atender aos reclamos de uma juventude idealista e inteligente. No entanto, o que vemos neste grave instante nacional, é justamente o oposto, isto é, todas as formas de brutalidade e violência utilizadas contra jovens desarmados, em massacres que contrariam nossas mais caras tradições’.

A congregação da Faculdade de Filosofia da UFPb, por decisão unânime do seu corpo docente, enviou à Câmara Federal moção de protesto contra a invasão da UnB, bem como ofício ao reitor da Universidade de Brasília hipotecando solidariedade aos universitários da capital. A proposta foi apresentada pela professora Maria Thereza Prost, da cadeira de geografia, numa reunião coordenada pelo professor José Paulo Pires, diretor daquela escola superior.

Na mesma data em que as forças militares invadiam o campus da Universidade de Brasília, os universitários e secundaristas de João Pessoa voltavam às ruas. Dessa vez para exigirem a extinção total das anuidades pelo Conselho Universitário, consequência da política educacional do governo, orientada pelo convênio Mec/Usaid, que pretendia transformar as universidades públicas em fundações privadas. Reivindicavam também a revogação das prisões preventivas decretadas contra o movimento estudantil.

Esse clima de tensão política, com seguidas manifestações da juventude estudantil contra a ditadura e sempre reprimidas com violência pela polícia, concorreu para que, quatro meses depois, fosse editado o Ato Institucional número 5, quando o regime militar instalado em 1964, enfim tirou a máscara e assumiu a sua condição de ditadura.

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