E quando a tela regride!

Um teste rápido: com que frequência você registra um adolescente lendo um livro em um banco de jardim, na sombra de uma árvore em um parque da cidade, numa mesa de lanchonete enquanto aguarda o sanduiche?

Segunda etapa do teste: com que frequência você registra um adolescente com postura curvada, dedos ágeis, manuseando celulares enquanto a sua volta nada tem sentido? Um grupo de crianças e adolescentes em uma mesa de lanchonete, de pizzaria, em dia de rodizio, onde cada um está imerso em seu próprio mundo resumido ao celular que é manuseado com a destreza de quem não consegue enxergar além da tela?

A resposta ao teste somente ganha substância quando ressalvamos que não se trata de condenação banal e inconsequente do conhecimento e, portanto, da tecnologia. Esta, resultado do trabalho humano no aperfeiçoamento de sua inteligência e de sua capacidade de interação com outros homens na construção de artefatos conceituais para entender e explicar o mundo, bem como, para melhor viver neste mundo, é positiva. O risco está em seu uso.

Assim, estudos recentes estão revelando algo assustador para nós. Pela primeira vez “os filhos passaram a ter mentes menos afiadas do que a de seus pais”. Ou seja, as novas gerações estão mais contraídas em sua capacidade de pensar, de transformar, de avançar no “processo civilizatório”.

O neurocientista francês Michel Desmurget, diretor de pesquisas do Instituto Nacional de Saúde da França, um dos especialistas que, nos últimos anos, tem se debruçado a investigar o fenômeno, revela um dos principais comportamentos que justifica essa estagnação intelectual: a excessiva quantidade de horas dedicada ao manuseio das telas dos mais variados artefatos digitais. E adverte: “A tela, em si, não representa um mal, mas o número de horas despendidas na sua frente é assustador”.

E os estudos científicos revelam ainda que o uso de computadores e de celulares por crianças apenas para se divertir é três vezes maior do que para a realização de trabalhos e tarefas escolares. Entre os adolescentes, esse percentual sobre para oito.

E quais implicações esses novos modos de vida traz para o desenvolvimento mental, intelectual e físico de crianças e adolescentes. Michel Desmurget adverte que “internet e aplicativos de redes sociais em demasia afetam negativamente as interações, a linguagem e a concentração, os três pilares básicos do progresso cognitivo em qualquer idade, mas de excepcional importância nos cinco primeiros anos da existência”.

Talvez agora a resposta para os testes sugeridos fique mais acessível. Ou não.

Não sei quantos leitores, mesmo não crianças e adolescentes, também estão contaminados por essa atrofia.

Pensemos!

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