A ocupação da FAFI em 1968

No dia oito de agosto de 1968, por volta das nove horas da manhã, os estudantes de João Pessoa reuniram-se no Clube do Estudante Universitário, na Lagoa, para discutirem a mobilização de protesto contra a prisão de Vladimir Palmeira, então presidente da UNE – União Nacional dos Estudantes, e a política educacional do governo. Participaram do encontro, representantes da UEEP, DCE, UNE e Grêmio Daura Santiago Rangel, do Liceu. Com o clube completamente lotado, os estudantes debatiam a tomada de decisão em relação a duas propostas: realização de passeatas pelas ruas da cidade ou instalar uma assembleia geral permanente na FAFI – Faculdade de Filosofia, transformando-a num QG do movimento. Prevaleceu a segunda alternativa, após acalorados e demorados discursos das lideranças presentes.

Quando a reunião estava se realizando, tomaram conhecimento de que caminhões da Polícia Militar, com aproximadamente cem soldados, se posicionaram no início da Avenida Padre Meira. Foi o bastante para provocar um clima de insegurança no local do encontro. Apesar do apelo dos líderes, tentando acalmar os secundaristas e universitários presentes, houve uma confusão generalizada, tipo “salve-se quem puder”, com muitos deles correndo em direção ao mercado central e outros se dirigindo para a FAFI. Entretanto o contingente policial manteve-se distante do CEU, ficando apenas de prontidão para agir, se necessário fosse. Concluída a reunião, ficou deliberado que iriam para a FAFI onde ficariam em assembleia permanente.

Ao saírem do Clube do Estudante Universitário, na Lagoa, no início da tarde do dia oito de agosto, onde estiveram reunidos durante toda a manhã, os manifestantes seguiram para a Faculdade de Filosofia da Universidade Federal da Paraíba, ao lado do Liceu. Lá se estabeleceram como o seu QG do movimento, ocupando o “hall” do prédio da FAFI para realizarem novos debates, a fim de traçarem as estratégias de atividades. Faziam questão de esclarecer para a opinião pública o caráter pacífico da manifestação, concentrando naquela escola superior todas as ações de protesto contra a prisão do líder estudantil Vladimir Palmeira e a política educacional brasileira.

Articulados com as lideranças nacionais, localizadas principalmente no Rio de Janeiro, onde o líder carioca continuava preso, incomunicável, os estudantes paraibanos se organizaram de forma a tornar permanente a presença deles na FAFI, enquanto persistissem os motivos dos protestos. Formaram vários grupos de pedágio com a finalidade de pararem os veículos nas proximidades do prédio onde estavam instalados, com o objetivo de arrecadarem recursos que permitissem suprir as despesas com alimentação e estadia dos estudantes durante a ocupação da FAFI.

À tarde, enquanto lideranças discutiam a organização do movimento, foram surpreendidos com o corte dos fios de telefone daquele estabelecimento, provocando indignação geral. Alertados do problema, exigiram dos dirigentes da faculdade o restabelecimento imediato das comunicações, no que foram atendidos em tempo rápido. Outro incidente que merece registro nas primeiras horas de instalação do comando, na FAFI, foi a identificação, pelos estudantes, de um homem trajando roupa preta, magro, alto, de aproximadamente vinte e dois anos, do qual desconfiaram tratar-se de um agente secreto do DOPS. Submetido a interrogatório, o suposto policial, só foi liberado horas depois quando tiveram a certeza de que sua presença no local não representava perigo de infiltração policial na manifestação.

Artistas, professores e intelectuais compareciam ao QG estudantil para prestarem solidariedade. Era intensa a frequência de personalidades paraibanas da política e da cultura, durante todo o período em que os universitários e secundaristas permaneciam na faculdade. A Polícia Militar, por decisão expressa do governador João Agripino, manteve-se todo tempo à distância, apenas orientada a não permitir a realização de passeatas, o que estava proibido pelo governo federal. O Delegado da Polícia Federal na Paraíba, Sr. Severino Romano, declarou à imprensa, num tom de advertência aos manifestantes, que “temos todos os elementos considerados líderes sob nossa pauta e se ainda não os mantemos isolados em suas próprias residências, é porque esperamos que esses jovens tenham adquirido a conscientização do que lhes pode ocorrer. Apreendemos alguns panfletos que foram distribuídos pela cidade e constatamos que essa distribuição não partiu da iniciativa dos estudantes e sim de elementos subversivos que tentam a todo custo levar adiante suas frustrações”.

Na noite do dia treze de agosto, o comitê dirigente do movimento estudantil deliberou pela desocupação pacífica do prédio da faculdade. Antes, porém, foi proferida uma palestra pelo professor Ronald Queiroz sob o tema: “Violência. Sim ou não”, quando se definia inteiramente favorável às lutas da juventude brasileira, alertando, contudo, “de que a violência só deveria acontecer em casos de extrema necessidade ou de flagrante provocação dos repressores”.

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