Borracha e a comida errada

VALIOMAR ROLIM

Borracha: esse foi o apelido que colocaram em Leopoldo. Cajazeirense de quatro costados, figura ímpar na cidade. Fez história desde a adolescência. Amigo de todos na cidade, não se sabe se pelo gosto esmerado de tomar umas e outras (bote-se muitas umas, ou muitas outras) ou pelo fato de ser fofinho, leia-se gordinho.

Sempre saia no corso do carnaval caracterizado de xerife. Até conseguiu ser expulso do Cajazeiras Tênis Clube. É que colocou um cartaz nas costas da tradicional fantasia onde se lia: venho do Cajazeiras Tênis Tapa.

Depois, foi suspenso do Cine Éden que, com o Cine Cruzeiro, do velho Eutrópio Cartaxo, divertia a cidade. Saiu no desfile carnavalesco todo molhado, com o indefectível cartaz: venho do Cine Éden, numa alusão ao calor do velho cinema.

Depois, responsável, pai de família, funcionário público, trabalhando na coletoria estadual, ainda com o gosto preservado por uma boa bebida, fez parte da equipe chefiada pelo fiscal do estado, Bernardino Bandeira, pai do engenheiro do mesmo nome que foi presidente da Telpa e Telemar.

Seu Bernardino, talvez por comodismo, ensinou Borracha a fazer todos os despachos, tudo, até que parecia um agente fiscal, mas tudo revisado e assinado por ele.

Borracha sentia-se o próprio fiscal de renda. Bons tempos aqueles, só que o que é bom acaba: Bernardino Bandeira, pressionado pelo crescimento e educação dos filhos, pede transferência para Campina Grande.

Foi um fim do mundo para Borracha…

Com muita tristeza assistiu o caminhão sair com a mudança do amigo e protetor. Tanto móvel, tanta tralha, nem parecia que, naquela casa, cabia tanta coisa.

Ficou algo entre feliz e orgulhoso quando Seu Bernardino pediu para que ele enviasse, na primeira oportunidade, um cachorro e um peru que não couberam na carga.

Procurou um portador de confiança. Um caminhão que lhe inspirasse crédito para tal mister.

Recebido o primeiro salário após a mudança do amigo, fez uma farra homérica. Dia seguinte, de ressaca e liso, viu sua mulher pedir dinheiro para comprar carne. Sem outra saída, mandou matar o peru.

Depois disso, conseguiu um portador.

Como na época não havia telefone interurbano, pelo rádio da Coletoria disse ao amigo que o peru havia morrido.

 Numa frase, Seu Bernardino mostrou que entendeu tudo, foi quando disse: “Borracha, bem que você poderia ter comido o cachorro”.

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