Saudosas lembranças

Já se vai longe o tempo em que ficar sentado às calçadas ou nas próprias calçadas, “jogando conversas fora”, era comum às famílias interioranas. Saudosos tempos! Após a janta, que se chamava ceia, sempre se observava o puxar de cadeiras ou de espreguiçadeiras que eram postas nas calçadas e que provocavam o ajuntamento de vizinhos, quando os adultos costumavam falar sobre o dia que terminava, as poucas notícias transmitidas pela “Hora do Brasil” e a troca de ideias a serem cumpridas nos dias seguintes. Eram conversas de adultos…

As crianças se divertiam em saudáveis brincadeiras infantis: amarelinha, academia, passar anel, pular corda, preso solto, cabra-cega e as indefectíveis brincadeiras de roda que, apesar de femininas, muitas vezes contavam com a presença de meninos, o que despertava nestes os primeiros “alumbramentos” de que falou o poeta Manuel Bandeira.

Nesta rua, nesta rua,
Tem um bosque
Que se chama, que se chama solidão
Dentro dele, dentro dele
Mora um anjo
Que roubou que roubou meu coração!…

Se eu roubei, se eu roubei
Teu coração,
Tu roubaste , tu roubaste o meu também…
Se eu roubei, se eu roubei teu coração,
É porque , é porque te quero bem!…

Ou essa outra:

Terezinha de Jesus
Deu uma queda e foi ao chão.
Acudiu três cavalheiros
Todos os três chapéus na mão.

O primeiro foi seu pai,
O segundo, seu irmão.
O terceiro foi aquele
Que a Tereza deu a mão!…

E ainda havia: Atirei o pau no gato, tô, tô…; Ciranda, Cirandinha…

Numa segunda fase, atentas, as crianças, já cansadas de gastar energias, sentavam-se em volta de algum adulto, com a finalidade de ouvir-lhes contar as estórias de trancoso.

Os prezados leitores hão de dizer: “– Mas, os tempos eram outros… os tempos mudaram…”

E eu lhes pergunto: “– Mas, por que mudaram, se hoje nos trazem tantas saudades?”

É que o modernismo e o progresso vão nos tornando seus escravos. Que o digam os seriados novelísticos que nos tiraram a inocência dos seriados cinematográficos, os ágeis noticiários televisivos que nos tiram a notícia inusitada da “Hora do Brasil”…

Que o digam os celulares, os smartphones, os compartilhamentos grupais que nos levaram a alegria dos contatos pessoais, inocentes, mas afetivos.

Mas, o tempo passou, ou melhor, nós é que estamos correndo e, para trás, vamos deixando a alegria e a inocência de sermos crianças…

Fazer o quê? É triste, mas é a realidade que nos cerca e contra a qual não podemos remar e nem determinar os rumos de nossas vidas.

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