Os Anos de Chumbo em minha memória (IV)

Depois desse veranico que interrompi a análise do tempo em que o pais era governado pelos militares (ditadura seria um termo pouco exato), entre outros motivos, a expectativa do nascimento de minha primeira neta (Cecília), que já nasceu e com saúde, e vou tentar continuar com a análise do episódio da bomba do Cine Apolo XI.

O que eu disse anteriormente, foi que haveria uma única certeza nesse episódio: A bomba tinha como alvo D. Zacarias, nosso Bispo Diocesano, tanto que foi colocada exatamente abaixo ou muito próximo à cadeira que ele costumava sentar-se para assistir o filme.

Hoje, conforme o tempo passa, vai entrando para a nossa mitologia. Dizem que o relógio da torre da Igreja Catedral, que se baseava o projetista e o público quando assistia aos filmes, estaria adiantado, em desconformidade com o relógio da bomba, o que fez com que o filme terminasse mais cedo, e o artefato explodido depois essas coincidências mágicas…

Agora vamos examinar o tempo que se deu o episódio: 1975 a luta armada praticamente não existia, a notícia mais próxima que se tem de algum grupo, seria ainda no ando de 1973, quando foi desmantelada uma organização por Recife, inclusive a partir de denúncias do Calabar da guerrilha urbana, o famigerado Cabo Anselmo. A própria Guerrilha do Araguaia, seu último membro foi assassinado nesse ano, seria estranho alguma organização escolher Cajazeiras, extremamente provinciana, em que nas conversas das calçadas (bons tempos) que todas as noites se reunia a cidade em pequenos grupos fara fofocar; se sabia da vida de praticamente todo mundo, e algum grupo subversivo alguma organização de esquerda (ou mesmo de direita) sofisticada a ponto de cometer um tipo de ato terrorista daquela natureza, dificilmente não teria sido detectado por esse aparato fofoqueiro: morreria no nascedouro. Esse nível de sigilo na Cajazeiras da época tinha pouca probabilidade de prosperar.

De fato, os movimentos que por aqui prosperavam, pelo menos os que eu tinha notícia, tendiam mais para a anarquia do que para alguma ideologia esquerdista, vou dar como exemplo uma fato lamentável ocorrido no próprio Cine Apolo XI. O diretor paraibano Paulo Pontes, que pouco tempo depois alcançaria a fama no Rio com a peça Gota d’água, teve sua peça PARAÍ-BÊ-A-BÁ, interrompida por vaias e piadas de muitíssimo mau gosto, e se suspendeu a apresentação. Até Mons. Abdon Pereira subiu ao palco para pedir silêncio e foi silenciado pelos que apupavam estrepitosamente essa apresentação. O diretor jurou jamais voltar a Cajazeiras…

Agora existia aqui um nicho em que sempre se guardou sigilo, até secular: As entranhas da Santa madre Igreja. Haviam entre os movimentos, tanto com os seminaristas, quanto os de organizações ligadas a Igreja católica, alguns membros que execravam mais ou menos publicamente nosso Bispo, considerando-o entre outras coisas: reacionário, houveram alguns padres italianos que sempre em seus sermões criticavam nosso Pastor. Como também, escondidos sob o fru-fru das sotainas e aos vapores do incenso, críticos do estado de coisas que por aqui aconteciam, e responsabilizando nosso bispo direitista (que sempre Zacarias o foi), agora quando do evento da explosão, com o enorme aparato enviado para cá, com os poderes que o sistema militar lhes outorgava, e as investigações que se procederam, algum grupelho desses teria muita sorte de não ser descoberto.

Padre Boyes (o Mister Boyes) padre americano chamado pelo bispo que morou por aqui durante certo tempo, ainda pela amizade que manteve com D. Zacarias depois, não teria condições nem motivações de preparar esse atentado. Conheço o pessoalmente e sua linha de ação sempre foi ligada ao magistério, e a cultura greco-latina, seu direcionamento nunca foi para a violência.

Os atentados da direita, o da OAB, Riocentro, aconteceram cinco anos depois do caso do Apolo XI, eu pessoalmente não consigo enxergar seja por tempo, seja por espaço, nenhuma possível conexão.

Sobra, na minha opinião, o atentado tipo lobo solitário, uma pessoa ou um grupo extremamente pequeno (dois ou três no máximo), que desejavam se livrar de nosso bispo de então, que entre os quais, estaria o próprio projetista Manoelzinho a primeira vítima, que segundo a viúva de Cb. Didi gritou: é uma bomba!!, na hora da explosão, mas que pode ter sido depois de explodido o artefato, só um suicida pegaria o mortal artefato, e naquele tempo o terror suicida não era como é hoje.

Agora vamos encerrar essa análise: Segundo sabemos e foi publicado em entrevista tempos depois, o possível alvo desse artefato, Dom Zacarias, sabia quem era(m) os autores do atentado a sua pessoa, mas levou ao túmulo o(s) nome(s). Conversando com Con. Gervásio Fernandes um dos meus queridos amigos que tem o mau gosto de ler essas bobagens que escrevo, ele atentou para o segredo de confissão: Ele pode ter sido informado durante uma confissão e respeitando o preceito do sigilo, acatou-o e nunca divulgou o confessante. Mais uma prova (se foi o que realente aconteceu, jamais saberemos), do caráter e da profissão de fé de Dom Zacarias.

Por aqui termino essas análises, se alguém as puder enriquecer, seja muito bem vindo.

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