O que se comemorava ontem no Rio de Janeiro?

Muita gente está a perguntar o que comemorava o presidente da república ao promover ontem, festivamente, um passeio de motos pelas ruas do Rio de Janeiro. Indagação que não tem resposta plausível, uma vez que nada justifica tal ocorrência, em razão da grave crise sanitária que o país está vivendo, dando causa a mais de quateicentas e quarenta mil mortes de brasileiros. É inconcebível que seja exatamente o chefe da nação quem toma a iniciativa de dar o mau exemplo ao descumprir as recomendações médico-cientificas para proteção contra o vírus, estimulando o não uso de máscaras e as aglomerações. 

O que se pode depreender da decisão do presidente é que, pressionado pelos acontecimentos políticos recentes (baixa aprovação popular do governo, pesquisas desfavoráveis à reeleição e revelações negativas de atuação no combate à pandemia pela CPI), não lhe resta outra alternativa a não ser tentar, a qualquer custo, produzir eventos que animem a sua militância e passem a impressão de que conta com apoio popular. É uma desesperada estratégia política para se manter na perspectiva da disputa eleitoral do próximo ano. 

A sensação de que estamos sem comando responsável, a nível nacional, no que toca à gestão pública de saúde para enfrentamento da pandemia, causa perplexidade, além de indignação, vendo o presidente se dedicar a realizar país afora eventos que afrontam todos os procedimentos orientados por organismos de saúde. O momento não permite festas, nem aglomerações. Vivemos um tempo de apreensão e preocupações. Ao invés de liderar movimentos de rua com motivações exclusivamente políticas, ele deveria estar buscando definir ações de governo que minimizassem os danos consequentes dessa doença, visitando hospitais, definindo campanhas publicitárias de orientação para que seja evitada a contaminação. O caminho que escolheu é adverso disso.

Prefere estimular a desobediência civil às normas sanitárias estabelecidas por autoridades dos governos estaduais e municipais, numa flagrante provocação política. Percebe-se o interesse em confundir a opinião pública, desprezando a responsabilidade que lhe é conferida pelo cargo que ocupa, com declarações contrárias ao que recomendam a ciência e a medicina. Ausência total de empatia e de sensatez. Cumplicidade com o estabelecimento do caos. Indiferença explícita com o sofrimento da população. 

Somos, sem qualquer dúvida, um povo que gosta de festa, mas é preciso que as lideranças políticas proclamem alertas sobre a probabilidade da alta transmissibilidade e risco de agravamento do preocupante quadro de saúde pública que estamos vivenciando decorrente da pandemia do coronavírus. Qualquer atitude diferente pode ser considerada  evidente irresponsabilidade. Não há como desconhecer a situação crítica que permanece nos ameaçando. Adotar os cuidados que se fazem necessários é, antes de qualquer coisa, um exercício de cidadania. Cada um deve fazer a sua parte. Principalmente aqueles que nos governam. 

A realidade está gritando à nossa porta. Desdenhar da doença como tática política é procedimento que não se harmoniza com os princípios inerentes ao cumprimento de missões públicas. Enquanto não tivermos a grande maioria da população imunizada, é absolutamente desaconselhado promover aglomerações, sob qualquer pretexto. Muito menos quando se procura dar prioridade a interesses pessoais objetivando ganhos políticos. A hora é de esquecer as diferenças e conflitos políticos e ideológicos, observando obediência ao necessário espírito de solidariedade na união de esforços para que possamos vencer esse terrível e invisível inimigo. A crise sanitária do covid-19 não pode ser transformada numa questão essencialmente política. 

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