Não dá para continuar no assa e come

Quando menino, para ver Cajazeiras do alto a gente fazia piquenique no serrote do Cristo, com direito a sequilho, mariola, broa de goma, sanduíche e guaraná de Zé Pires. A cidade tinha cerca de 10 mil habitantes. A bem dizer, todos se conheciam. Havia dois colégios: o dos padres e o das freiras. A prefeitura tinha um tesoureiro e um secretário. Médicos, advogados, dentistas, farmacêuticos contavam-se nos dedos da mão. A política girava em torno de dois partidos: UDN e PSD. E de Otacílio Jurema, mais forte do que os partidos.

No palanque, todos falavam em mudança.

Pouco mais tarde, alguns privilegiados podiam voar no avião de Antônio Tomaz, que ele mesmo pilotava e consertava qualquer defeito no teco-teco. Aí chegou o Douglas da Aeronorte/Aerovias/Real, consórcio absorvido pela VARIG. Um dia, eu já estudava na Bahia, nas férias de 1963, cheguei a Cajazeiras no velho DC-3. Do alto, vi o Açude Grande, o hospital, as igrejas, o Ginásio Salesiano. A Rodoviária de Raimundo Ferreira realçava quase como a torre da catedral… Voltei para Salvador, depois de participar, ativamente, da campanha eleitoral de Raimundo, que não tinha apoio de chefe político importante. Eu fazia o guia eleitoral e discursava em palanque.

Em agosto passado vi Cajazeiras de cima.

Impressiona a expansão urbana para todos os lados. Edifícios espalhados, o Perpetão, os hospitais, o campus da UFCG, o Santa Maria, a Católica, o IFB, a FASF, além das igrejas. De retorno ao Recife, pergunto à jovem mãe, sentada a meu lado com sua filhinha de colo, você mora em Cajazeiras? Com a cabeça diz sim.

Ah, é daí mesmo?

– Não, não… sou do Recife.

Então é professora universitária, arrisco.

– Não. Trabalho em órgão federal, passei no concurso e fui nomeada para Aurora.

Mas seu marido é de Cajazeiras…

– Também não… cearense, trabalha em Ipaumirim, fala com um sorriso largo. 

Oxente… por que vieram morar em Cajazeiras?

– A cidade é maior, tem quase tudo. Mais conforto… eu viajava de avião até Juazeiro… agora melhorou.

Cajazeiras mudou. Menos a forma de fazer política.

O descaso com o futuro do município é enorme! Administra-se no improviso, enquanto graves problemas estruturais se acumulam para explodir lá na frente. Um assa e come, com a mesma sem-cerimônia do discurso da mudança. Desunem-se. Depois se unem. Sempre foi assim. Mas, em torno de quê? Antes era perdoável. Hoje não. Não dá para continuar no assa e come do passado.

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