Coração 3D

A cada dia a ciência moderna esbugalha nossos olhos com suas descobertas como se o jargão “isso é só o começo” fosse o slogan “coca-cola é isso aí”. 

Não tem nem duas semanas vimos a revelação do tal Buraco Negro como inusitado para compreensão da origem do universo. 

Ontem à noite (vou crasear aqui porque o próprio word está indicando. Ele sabe mais gramática do que eu – é a ciência!), estava bebendo minha cervejinha e vendo jornal televisivo despreocupadamente, quando é mostrado reportagem sobre cientistas israelenses que criaram um coração em 3D, do tamanho de uma cereja, produzido com células humanas e que abre caminho para realização de transplantes sem riscos de rejeição. 

Peguei o copo, dei uma golada funda na cerveja e respirei entre esperançoso e receoso (mais uma vez o word me corrige. Escrevi ‘receioso’ quando o correto é receoso – um dia colocarei um chip desse word em meu cérebro com a divina ajuda da ciência). 

Como a ciência está muito ousada espero que esse coração 3D já venha acoplado com artérias que bombeie apenas sangue terno, afeiçoado, afetivo para todo nosso corpo para sermos gente racional distante das afetações cotidianas e acima de tudo das presunções políticas que palpitam corações de direitistas fascistas e de esquerdopatas. 

Fiquei esperançoso porque teremos a chance de ficarmos livres das laives das redes sociais; libertos das boçalidades bolsonaristas; das puerilidades esquerdistas (vejam que sempre tento balancear o discurso esquerda x direita para não ser taxado pelos amigos nem de direitista nem esquerdista, mas prefiro dez mil vezes ser tachado de esquerdista em nosso contexto histórico).

Receoso porque me preocupa esse 3D se degringolar para as veias políticas abertas da América Latina, onde toda riqueza do continente, em séculos passados, foi carreada, para não dizer explorada, para a Europa (vixe maria! Escrevi Europa com letra minúscula – esse copo de cerveja me mata de vergonha – e o corretor do word já me deu bronca instantaneamente – é a ciência, irmão!). 

Coração de verdade, para mim, ainda é o Coração de Estudante, de Milton Nascimento e Wagner Tiso, saudáveis na música e alimento da alma.

Segundo os cientistas israelenses talvez em dez anos haja impressoras 3D imprimindo rotineiramente esses corações nos melhores hospitais do mundo.

Depois de tudo isso exposto, fui na geladeira pegar a saideira. A garrafa estava geladíssima, abri calmamente, enchi o copo, dei um gole, e tive o sentimento profundo de que a ciência só estará evoluída no dia que criarem um fígado pelo menos em 2D.

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