“A linha e o linho”

A construção de um pensamento através de metáforas é muito comum nas letras de músicas brasileiras. São figuras de linguagem que permitem uma melhor compreensão da mensagem por analogia. É o caso de “A linha e o linho” de Gilberto Gil, música lançada em 1983, que usa a prática do bordado para dar força ao desejo do “eu lírico” de falar sobre o entrelaçamento efetivo e permanente entre ele e a pessoa a quem ama. Uma espécie de costura de uma história sentimental.

“É a sua vida que quero bordar na minha/Como se eu fosse o pano e você a linha/E a agulha do real nas mãos da fantasia/Fosse bordado, ponto a ponto, nosso dia-a-dia”. O personagem da música, ao querer afirmar sua vontade de consolidar a relação com alguém que ama, utiliza-se da ação de bordar para compor a imagem de um único sentido na vida de dois enamorados. A linha se envolvendo no pano e formando juntos os desenhos do enredo romântico, o sonho tornando-se realidade. As iniciativas e as atitudes construindo o mundo real, como se fossem uma agulha nas mãos de alguém, que ponto a ponto, estivesse produzindo um bordado.

“E fosse aparecendo aos poucos nosso amor/Os nossos sentimentos loucos, nosso amor”. Quem se dá ao trabalho de executar um bordado, vai se realizando, ao perceber que lentamente vão se delineando os contornos da figura que projetou. Metaforicamente é assim que se define a estrutura de uma história de amor. O movimento das mãos ágeis e habilidosas de quem está a bordar, simboliza o vivenciar de sentimentos loucos na consolidação de um envolvimento amoroso.

“O ziguezague dos tormentos, as cores da alegria/A curva generosa da compreensão/Formando a pétala da rosa da paixão/Sua vida o meu caminho, nosso amor/Você a linha e eu o linho, nosso amor”. O ziguezaguear da agulha penetrando no pano, a revelar o colorido da imagem do bordado, tem semelhança com o vaivém de acontecimentos que refletem os prazeres de uma envoltura romântica. A “rosa da paixão” representando, a cada pétala formada, a compreensão de que os dois começam a construir caminhos comuns na vida, assim como o fazem a linha e o linho.

“Nossa colcha de cama, nossa toalha de mesa/ Reproduzidos no bordado/A casa, a estrada, a correnteza/O sol, a ave, as árvores, o ninho da beleza”. A colcha da cama e a toalha de mesa são utensílios na vida de um casal, relacionados ao descanso e ao alimento de forma compartilhada. Neles, bordados os cenários da vida a dois, a casa, a estrada, o ambiente, a natureza, o verdadeiro ninho da beleza do amor.

Do livro CANÇÕES QUE FALAM POR NÓS

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