O carnaval e o maldito vírus

Por volta de vinte e duas horas dessa última sexta-feira, eu estava bebendo minha suave e substancial cerveja em casa, devido ao escroto vírus, pois não me arrisco a ir a boteco ou manifestações em público, quando a sonoridade do zap me alerta para mensagem. Vejo que é um amigo, também sorvendo seu cálice da vida em casa, me pedindo para escrever uma crônica sobre o carnaval.

Vejam só. Não me sinto numa situação particular, mas coletiva, em que todos meus amigos e pessoas sensatas não devem esquentar os tamborins em eventos públicos em respeito a si e aos familiares de mais de duas centenas de milhares de vítimas da covid que choram a ausência de pessoas falecidas que deveriam estar sambando em seus redutos carnavalescos repletas de confetes.

Vou usar uma expressão simplista, porém verdadeira: Isso é de cortar coração. Neste momento em que redijo este texto, sinto lágrimas escorrendo no canto de meus olhos. Acreditem, não é efeito etílico. É revolta pelo negacionismo escroto pela ciência e desprezo pela saúde pública de autoridades que encaram com naturalidade essa época das trevas. Pior: a qualquer momento pode ser eu, você, seu amigo, seu familiar, que caia nas garras do último toque fúnebre da baqueta no tamborim soando sob as lágrimas de três ou quatro pessoas próximas e mais ninguém no campo da paz celestial por impedimento de saúde pública.

Nos últimos anos passei o carnaval em minha amada Cajazeiras sem eira nem beira. Transbordei o copo e o corpo pelas ruas da cidade pipocando em paralelepípedos e asfalto selvagem. Samba, suor e cerveja na praça da prefeitura foi o ritmo inevitável e desejável para qualquer pé de chinelo momesco, com eu. Os Imprensados colocaram-me no bloco e no beco sem saída da alegria.

Portanto, meu caro amigo, não tenho crônica de confetes para este ano. Quando meu braço der o abraço na segunda dose da vacina, vaticinarei que no próximo carná encarnarei a alegria como a última dose do último acorde dos tambores na avenida.

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