A fé e a política podem se misturar?

Essa é uma pergunta que nós brasileiros ficamos a fazer no momento político que estamos vivendo, quando se pretende levar ideologias religiosas para a política. O mais grave é que se verificam discursos que contradizem com a pregação cristã. O Brasil é um Estado laico. Não existe uma religião oficial admitida como tal constitucionalmente e é garantida a liberdade de credo para todos os cidadãos. O debate público, portanto, não comporta o pensamento religioso.

Quando se mistura política e religião o resultado, nem sempre, é benéfico. A sociedade não pode ser moldada de acordo com as conveniências ditadas por crenças religiosas. As tradições e concepções religiosas devem ser respeitadas dentro de conceitos que não afetem os princípios de pluralidade e laicidade estabelecidos constitucionalmente.

A fusão entre a fé religiosa e a política sempre existiu, é verdade. Porém, não há como ignorar que cada indivíduo possui em si valores íntimos que, não necessariamente, se harmonizam com os valores do próximo. Daí nasce a ação política como mediadora social. A religião, embora se afirme igualmente com os mesmos propósitos, atua de forma diversa, com base em fundamentos que determinam comportamentos, procurando influenciar pensamentos na lógica do que defende cada crença. A religião buscando exercer controle social a partir da fé individual se conflita com a compreensão de um Estado laico e plural.

A religião, portanto, não pode ser usada como palanque eleitoral, com candidatos se utilizando da fé para conquistar votos. E o pior, o fazem de forma demagógica, indevida e hipócrita, com o discurso do falso moralismo. Não consigo compreender a necessidade da existência de uma bancada religiosa, com o objetivo de levantar bandeiras de cunho particular demasiadamente conservadoras, procurando impor dogmas num país plural e laico e se contrapondo a avanços e conquistas sociais.

A religião é algo muito pessoal, e por isso não pode impor à coletividade situações originadas nas crenças individuais. É imprescindível o diálogo, sem desprezar a importância dos argumentos apresentados pelos líderes religiosos que se tornaram políticos. Mas sem lançar mão do bom senso e da racionalidade.

Temos exemplos desastrosos na História universal do uso místico na política: a Inquisição e o Estado islâmico. Sob o pretexto da fé, da moral e dos bons costumes, esse ativismo político-religioso vai de encontro ao estado democrático de direito.

Antes que alguém queira me classificar como contrário à religião, quero dizer que sou cristão e creio em Deus. No entanto, procuro distinguir o moral, segundo as Leis de Deus, e a lucidez da visão de mundo que se permita fazer justiça conforme o próprio ensinamento de Jesus: “dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus”.

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