A ditadura do relógio

Ouvi nesse instante no rádio a música que não me soava há longa data. O Tempo não Para, de Cazuza. Quantas e quantas vezes já ouvi essa música, ou, por que não dizer, nós já ouvimos, caros amigos. Praticamente todo mundo já ouviu essa canção. Principalmente quando ele diz e repete várias vezes que o tempo não para, e sempre ficamos cantando balbuciando que o tempo não para.

Falo isso porque recebi relatório em meu celular avisando a minha média de uso diário das redes sociais foi de duas horas e dez minutos.

Meu deus do céu, será que usei isso tudo mesmo ou deixei o celular meramente sintonizado e esqueci de desconectá-lo? Acho muita duração. Ou estou sem base para cálculo temporal nessa pandemia, onde o tempo, para uns, se alargou, e para outros, se estreitou?

Que nada. Independente da pandemia o tempo é um bem de consumo sem percebermos. Uns o consome esbanjando, outros o regula com proveito nos parâmetros de sua racionalidade.

Quando criança o tempo não faz diferença alguma. Lembro-me perfeitamente na infância correndo de pés descalços, esgueirando sem eira nem beira às sombras das casas nas calçadas pelas ruas de Cajazeiras, no calor do sertão, que a ditadura do relógio era coisa de gente grande.

Descobri que a tirania do relógio começou a existir em mim quando o colocaram no alto da torre da igreja Catedral, que, praticamente de qualquer ponto da cidade onde você estivesse via as horas. A cidade de Cajazeiras não havia crescido, praticamente inexistia prédio alto. Daí em diante os meus vinte e pouco anos foram regulados pelos ponteiros rápidos das horas daquele relógio. E os indicadores de minutos me empurraram para Brasília, onde hoje conto os segundos para essa pandemia passar.

O relógio nos impôs a pressa e nos regula em tudo. Cedo ou tarde do dia ele está nos guiando autoritariamente. Falar nisso já está na hora de tomar uma cerva, que, aí sim, o tempo passa muito rápido. Nesse caso, e pelo menos nesse caso, decreto da natureza deveria estabelecer greve do tempo e ele parasse.

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