O acerto até nas divergências

Tenho acompanhado com muito interesse as sessões da CPI da Pandemia. A cada depoimento somos convencidos do quanto foi acertada a decisão de instalar essa comissão parlamentar de inquérito. As revelações feitas, algumas propositadamente e outras por descuido do depoente, municiam a constatação de que a pandemia não tem sido tratada pelo governo federal com a responsabilidade que essa crise sanitária exige. Essa verdade fica cada vez mais evidente.

Acho que os integrantes da comissão têm conduzido bem a investigação a que se propõem.  Com extrema competência estão sabendo colher os elementos que comprovam, não só as omissões do governo, mas também as atitudes e discursos negacionistas contrários às medidas restritivas de proteção à saúde da população, promovendo campanhas em total desobediência às orientações da ciência e da medicina.

Os senadores comprometidos responsavelmente com a apuração de uma realidade que a cúpula governamental tenta, a todo custo, esconder, acertam até quando divergem entre si. Foi o que vimos quando do depoimento do ex-secretário de comunicação, Fábio Wajngarten, que chegou à comissão com a determinação de mentir o quanto pudesse, desde que não comprometesse o presidente da república e seus ministros. Por incompetência não conseguiu fazer isso a contento, foi flagrado na mentira durante toda sua fala, cometendo o crime de falso testemunho. Todas as suas afirmações foram desmentidas na própria sessão.  

Isso ensejou o pedido de prisão do depoente, na conformidade do que estabelece o artigo 342 do Código Penal que diz textualmente: “ É tipificado como crime, fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral”. O pedido do relator, senador Renan Calheiros, foi reforçado por outros senadores presentes à sessão. Estavam certos. De fato o ex-secretário cometeu em flagrante o crime de falso testemunho. A falta de reprimendas legais ao comportamento pautado na mentira, poderia ser considerado um precedente perigoso e comprometer o seus resultados. 

Todavia, o presidente da CPI, senador Omar Aziz, não acatou a solicitação, o que, no meu entendimento também acertou. A prisão do antigo assessor do governo seria aproveitada pelo bolsonarismo como uma medida que tentariam caracterizar como perseguição política. Era a vitimização que explorariam nos discursos dos fanáticos apoiadores do governo. O presidente agiu com sabedoria, preferindo aceitar a sugestão do senador Humberto Costa, determinando o encaminhamento dos autos do depoimento, na íntegra, ao Ministério Público para que sejam tomadas as providências cabíveis no sentido de promover a responsabilização, inclusive com a aplicação de penas restritivas de direito por cometimento do crime de falso testemunho perante a CPI.   

A decisão salomônica do senador Omar Aziz servirá como advertência para os próximos depoentes, na orientação de que não podem faltar com a verdade, sob pena de sofrerem sanções penais previstas em lei. A CPI caminha bem na apuração das responsabilidades governamentais no enfrentamento da pandemia. Considero este um momento histórico da vida nacional. 

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